Filho de Herzog, 50 anos após assassinato de Vlado, critica impunidade de envolvidos em torturas e mortes: é preciso revelar o que foi a ditadura

18 de outubro de 2025 10:52

Engenheiro, ele é o filho mais velho do jornalista Vladimir Herzog. É presidente do Conselho do instituto que leva o nome de seu pai. Nos últimos 50 anos, Ivo Herzog desenvolveu uma habilidade particular: a de arquivista de memórias. Filho mais velho do jornalista Vladimir Herzog, o Vlado, assassinado na ditadura militar, em 1975, o engenheiro se tornou um porta-voz da história da família. O crime completa 50 anos neste mês.

Catalogar detalhes da vida do pai – e, por consequência, das violações de direitos humanos do regime de exceção – virou uma ocupação formal em 2009, quando a família criou o Instituto Vladimir Herzog, que hoje funciona em uma casa na Vila Madalena, na zona oeste de São Paulo. Ivo preside o conselho da entidade.

“Muita gente fala que a gente deve virar essa página em relação à ditadura de 64, e eu concordo, mas, primeiro, é preciso escrever a página, escrever como ela realmente aconteceu, quem são os personagens e qual foi o papel de cada um”, afirmou o engenheiro ao Estadão.

Passados 40 anos do fim da ditadura, testemunhamos uma nova tentativa de golpe. Considera que a impunidade do passado tem relação com o momento atual?

Totalmente. Ao longo da história republicana do Brasil houve mais de uma dezena de tentativas de golpes, alguns bem-sucedidos. O que todas essas tentativas de golpes têm em comum? A participação dos militares e a impunidade. O julgamento atual do STF (Supremo Tribunal Federal) é histórico, é uma guinada na tradição de impunidade do Brasil.

O ministro Flávio Dino defendeu que o STF decida se a Lei da Anistia se aplica aos casos de desaparecidos políticos. Concorda?

Isso meio que já está pacificado, que esses crimes continuados não são objeto de anistia. A minha preocupação é usar a exceção da Justiça e achar que está tudo resolvido. Na última semana tivemos a entrega de centenas de atestados de óbito retificados para familiares de vítimas da ditadura. Faz parte de um processo de reparação, mas ele não termina ali. Muita gente fala que a gente deve virar essa página da história em relação à ditadura de 64, e eu concordo, mas, primeiro, é preciso escrever a página, escrever como ela realmente aconteceu, quem são os personagens e qual foi o papel de cada um desses personagens.

A ditadura fez centenas de mortos, mas o seu pai virou um símbolo. A que você atribui a importância que o assassinato dele ganhou?

Porque era judeu, porque era um funcionário de uma TV pública, porque era contra toda a violência, porque era professor da USP, porque o Estado tentou fazer a farsa do suicídio, porque já tinham matado um monte de gente e talvez essa tenha sido a gota d’água que fez transbordar o copo, porque a minha mãe teve a coragem e a determinação de trazer a verdade e buscar a Justiça em nome dos filhos e passou a vida toda fazendo isso.

Como era Vladimir Herzog na intimidade?

São poucas as memórias: ele gostava de fotografia, astronomia. A gente tinha um sítio em Bragança Paulista, onde ele tinha os bichinhos, pombos, coelhos. Adorava pescar. Nunca teve carteira de motorista. Como eu falei: até o dia 25 de outubro, era uma família como outra família qualquer. Não é que ele era um cavaleiro em um cavalo branco com uma espada tentando salvar o mundo. Não, ele era um jornalista, um cineasta, fazendo o trabalho dele, com uma preocupação de fazer alguma coisa de interesse público. Isso, por si só, se opõe a um governo autoritário.

  • Ivo Herzog: filho de Vlado critica impunidade de envolvidos em torturas e mortes e “normalização” da ditadura. Foto: Jean Carniel/Estadão
  • Fonte: O Estado de S.Paulo

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