Governo amplia busca por protagonismo na segurança pública com pacote que tipifica facções e facilita confisco

23 de outubro de 2025 08:22

Os ministro da Justiça, Ricardo Lewandowski, entregou ontem ao Palácio do Planalto um conjunto de medidas, chamadas de “pacote antifacção”, que visa endurecer o combate ao crime organizado no país e inclui propostas como o aumento de penas e a maior possibilidade de confisco de bens. A iniciativa engrossa uma lista de movimentos do governo Lula no enfrentamento à violência como intuito de reforçar o projeto do presidente à reeleição. Uma das principais preocupações da população, a insegurança também mobiliza os chefes da Câmera, Hugo Motta (Republicanos-PB), e do Senado, Davi Alcolumbre (União-AP), que buscam priorizar o andamento de propostas na área.

No pacote anunciado por Lewandowski, consta, por exemplo, a criação do tipo penal de “organização criminosa qualificada”, que prevê pena de até 15 anos de prisão e englobaria facções do tráfico e milícias. Também estão no texto a hipótese de apreensão e perdimento antecipado de bens e a previsão legal para infiltrar agentes e empresas fictícias na estrutura das quadrilhas. O projeto ainda passará pelo crivo do ministério da Casa Civil, de Rui Costa, antes de ser enviado ao Congresso.

“Estamos fazendo alterações no Código Penal, no Código de Processo Penal, na Lei dos Crimes Hediondos, na Lei da Prisão Temporária e na Lei de Execução Penal. Esse é o projeto possível neste momento, fruto de uma longa discussão com todas as áreas. Nós queremos atacar o crime de forma mais estruturante”, afirmou Lewandowski.

Interlocutores do ministro argumentam que a lei atual que define uma organização criminosa não se encaixa mais na realidade de cerca de 80 facções operando no país. Por isso, sugerem atualizar a legislação com a criação da nova figura penal para combater grupos como Primeiro Comando da Capital (PCC), Comando Vermelho (CV) e milícias.

Em outra frente, o Ministério da Justiça lançou ontem o programa Município Mais Seguro, que injeta recursos federais nas guardas municipais. O investimento deve chegar a R$ 170 milhões, destinados a 215 cidades do país, na sua primeira fase. A pasta vai destinar parte do Fundo Nacional de Segurança Pública a projetos de gestão, equipamentos e capacitação das guardas

“O Supremo deu uma nova função às guardas municipais, que enfrentam criminalidade, muitas vezes sem recursos materiais e humanos. Agora, vão ser contempladas”, discursou Lewandowski.

Apesar de aliados de Lula defenderem maior protagonismo do governo na pauta, outros apoiadores admitem que a gestão petista corre riscos políticos ao enfrentar o tema. O próprio presidente precisou ser convencido por Lewandowski e outros auxiliares a investir nesta seara. Um dos receios é entrar em debate de responsabilidade com os estados, além da possibilidade de ver as ações encampadas pelo Planalto desfiguradas no Legislativo.

Os principais pontos do projeto. Infográfico O Globo/Reprodução

O entorno do Lewandowski tenta superar as diferenças no governo e avançar no Congresso apostando na boa relação da cúpula da pasta com o presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB). Uma das prioridades é chegar na eleição do ano que vem com a PEC da Segurança, que unifica a ação das polícias no Brasil, aprovada.

Depois de o tema ter dividido alas da gestão na fase de elaboração, o governo passou a chancelar a PEC também na internet. Na semana passada, a Secretaria de Comunicação Social (Secom) usou o mistério sobre a morte de Odete Roitman, na novela “Vale tudo”, para pedir a aprovação do texto nas redes sociais.

Ao mesmo tempo, o Palácio do Planalto tem incentivado a divulgação de ações da Polícia Federal (PF), seja no combate a crimes sexuais, na atuação nas fronteiras ou em operações contra adulteração de combustível e fintechs. O titular da Secom, Sidônio Palmeira, é um dos entusiastas da tática de buscar mais visibilidade ao trabalho da PF.

A violência é o tema que mais preocupa 30% dos brasileiros, e vem avançando desde julho, quando representava o maior receio para 24% da população, segundo pesquisas Genial/Quaest. A segurança pública está na frente de tópicos como problemas sociais (18%), economia (16%), corrupção (14%) e saúde (11%).

Na Câmara, após o desgaste da PEC da Blindagem, Hugo Motta tenta reconstruir sua imagem e recuperar protagonismo político apostando na agenda da segurança pública. Nas últimas semanas, ele transformou o tema em vitrine de sua gestão e passou a explorá-lo intensamente nas redes sociais – foram cinco publicações, apenas neste mês, exaltando projetos de endurecimento penal e medidas de combate ao crime organizado.

Anteontem, a Câmara aprovou um pacote de quatro projetos de segurança pública com apoio unânime de base e oposição. O conjunto de propostas aumenta penas para homicídios de policiais, cria o crime de “domínio de cidades” – o chamado “novo cangaço” – , reforça o enfrentamento a facções e autoriza a coleta de DNA de reincidentes.

“Essa presidência trata este tema com prioridade. Temos ouvido o clamor da população”, disse Motta em plenário.

Enquanto isso, os debates também mobilizam a direita. Na oposição, há a orientação para que as bancadas não votem contra pautas que contemplem alguns dos seus principais eleitorados, como as Forças Armadas e policiais.

“A pauta da segurança pública deste governo é acéfala. A PEC da Segurança não anda. O que tem apoio prático é o Pacote contra Crimes Violentos que aprovamos, e pretendo despachar diretamente com o presidente Hugo Motta”, diz o senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ), negando temer que aqueles que têm afinidade com as pautas da segurança pública troquem de lado. “Só tentam capitalizar em cima.”

  • Alinhados: o presidente Lula com o ministro da Justiça, Ricardo Lewandowski: medidas de segurança. Foto de arquivo: Bruno Peres/Agência Brasil
  • Fonte: O Globo

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