Fortalecido, Milei prioriza reformas trabalhista e tributária
28 de outubro de 2025 10:01Após respaldo das urnas e com Congresso menos hostil, presidente promete avançar agenda liberal Um dia após a contundente vitória nas eleições legislativas da Argentina, Javier Milei indicou quais são os seus planos para os próximos dois anos de mandato. Com um Congresso mais favorável, ele propôs avançar suas reformas liberais, incluindo a trabalhista e a tributária, mas sabe que ainda terá de dialogar.
Um dia após a contundente vitória nas eleições legislativas da Argentina, Javier Milei indicou quais são os seus planos para os próximos dois anos de mandato. Com um Congresso mais favorável, ele propôs avançar suas reformas liberais, incluindo a trabalhista e a tributária, mas sabe que ainda terá de dialogar.
“Na área tributária, temos um plano para reduzir 20 impostos, diminuir as alíquotas e expandir a base tributária para que, com a redução das alíquotas, a sonegação se torne desnecessária. As pessoas não querem ficar no setor informal. Isso libera recursos para o setor privado”, disse Milei, em entrevista à emissora Aza4.
O presidente apresentou também seus planos para a reforma trabalhista, a primeira que ele deve impulsionar Congresso: aumento da jornada de trabalho de 8 para 12 horas, fragmentação das férias, pagamento de salários com “vale-alimentação” e o parcelamento de multas rescisórias ou judiciais.
Segundo o governo, a proposta pretende flexibilizar os contratos de trabalho para incentivar mais empregos em médias e pequenas empresas. A medida atenderia tanto aos empregadores quanto à população, que vem reclamando do aumento do desemprego. Quase metade dos argentinos hoje trabalha na informalidade. Mas muitas dessas medidas devem ser discutidas na Justiça.
Reflexo
O dia seguinte à vitória de Milei registrou uma reação positiva do mercado financeiro. Ontem, a Bolsa de Valores de Buenos Aires se recuperou quase 31%, medida em dólares, a maior alta em um único dia nas últimas três décadas.
Os títulos argentinos subiram mais de 20% nos EUA, as ações de empresas argentinas na Bolsa de Nova York dispararam, em especial as dos bancos, e o risco país caiu para 652 pontos, nível equivalente a junho. A moeda americana chegou a ser vendida a 1.430 pesos no Banco Nación, 85 pesos a menos que na sexta-feira, uma queda de cerca de 5,6%.
O mercado já previa que a coalizão governista venceria cerca de 30% das cadeiras na Câmara dos Deputados, mas os resultados foram acima da expectativa. O partido de Milei, A Liberdade Avança (LLA), foi de 37 deputados para 93. Somando com os aliados PRO (Proposta Republicana), de Mauricio Macri, a coalizão chega a 107 cadeiras.
Considerando-se que UCR (União Cívica Radical) acompanhe o governo, são 10 no total para respaldar a agenda do presidente. Não é a maioria, mas será a maior bancada.
O peronismo retrocedeu, mas pouco. O partido kirchnerista Força Pátria que está dentro da coalizão União pela Pátria, de esquerda, manteve os 98 assentos que já tinha. Contudo, perdeu o posto de maior bancada.
“A coalizão LLA está confirmada como uma força nacional, estendida e com apoios em distritos-chave. E cresceu em outros distritos onde havia encontrado dificuldades em se estabelecer até agora”, disse o cientista político e analista de dados eleitorais
Coalização de Milei será a maior bancada
Com os resultados, Milei terá mais margem de manobra. Na nova configuração, o presidente terá de dialogar com cerca de 20 deputados para avançar em seu programa. Algo possível, desde que Milei não repita nos próximos dois anos os erros do passado, quando brigou com sua base.
“Teremos de ver o que acontece no futuro e se o discurso em que ele propôs negociações realmente se traduz em uma colaboração com as outras forças políticas. Até agora, isso não aconteceu, então veremos”, aponta Lourdes Puente, cientista política e professora na UCA (Universidade Católica Argentina).
“Agora, vamos voltar a uma lógica onde a Casa Rosada pode negociar com os governadores um a um, sem enfrentar um bloco homogêneo, sólido e consolidado. Isso vai facilitar as condições de negociação”, afirma Cruz.
Na Argentina, os governadores são importantes lideranças regionais com poder de influenciar o Congresso. Na primeira metade de seu mandato, Milei brigou com os governos provinciais de sua base de apoio. Essa atitude fez os dirigentes montarem um bloco contra a Casa Rosada e, desde então, nenhum projeto mais foi aprovado.
Ontem, Milei garantiu que buscará consensos. “Com esse resultado, tenho de sair e buscar os votos de que preciso para implementar essas reformas de segunda geração, que são importantes para o povo argentino”, disse.
No Senado, o cenário para o governo será ainda mais favorável. Antes com apenas 6 senadores, o LLA terá 18 a partir de 10 de dezembro quando assume o novo Legislativo. Somando ainda o PRO, a bancada governista chega a 24 – um terço da Casa de 72 assentos. Este era o número de ouro que Milei buscava. A oposição peronista terá outro terço e o restante ficou pulverizado entre outras forças.
A vitória de domingo, contudo, está longe de ser o fim do inferno astral do presidente. As eleições da Província de Buenos Aires, em setembro, enviaram um recado: a população não está contente com a estagnação econômica. Milei disse ter ouvido e prometeu mudanças.
Sentimento antikirchnerista e desejo de estabilidade econômica explicam resultado
Javier Milei teve quase 50 dias para recalcular a rota depois de sofrer uma derrota nas eleições provinciais de Buenos Aires, em 7 de setembro. Foi certoiro. No domingo, seu partido protagonizou uma reviravolta que surpreendeu cientistas políticos, consultorias de risco e o mercado financeiro.
Analistas ouvidos pelo Estadão explicam que Milei ouviu os eleitores, baixou o tom e acertou na estratégia ao polarizar a campanha e apostar no antikirchnerismo. Também contou com o erro dos peronistas ao separar as eleições da província e as nacionais e teve até um empurrãozinho de Donald Trump.
Milei foi rápido, em 7 de setembro, ao reconhecer a derrota na Província de Buenos Aires, que concentra 40% do eleitorado e não incluía própria capital. Após os resultados, garantiu ter ouvido que os argentinos não sentiam os reflexos de suas medidas econômicas e prometeu que corrigiria seus erros.
“Foi um discurso mais esperançoso, porque falou de construir com outras forças, falou que vai governar para os 47 milhões de argentinos. É um discurso diferente do que vinha sustentando”, afirma Lourdes Puente, cientista política na UCA (Universidade Católica Argentina).
“Na Argentina, o povo dá aos seus líderes um mandato que às vezes dura dois anos, três, quatro. Normalmente, não são nem muito curtos nem muito longos. E o mandato de Milei era pra controlar a inflação”, afirma Fabian Calle, professor de ciência política na UCA. “O mandato dele foi para estabilizar a economia. E ele fez isso.”
Estratégia
As eleições de meio mandato, historicamente, servem de “referendo” sobre quem está na Casa Rosada. Sabendo disso, Milei fez uma aposta arriscada: jogar com a polarização.
“O governo foi bem-sucedido na sua campanha em polarizar e apostar no seu discurso de “não voltemos atrás, falta pouco e estamos na metade do caminho”, afirma Lourdes. Milei lembrou que a Argentina que encontrou em 2023 foi justamente a que deixou o kirchnerismo, e votar pelo movimento seria retornar a este ponto.
Era um discurso arriscado. Dias antes, essa mesma força política havia ganhado de Milei por 14 pontos porcentuais nas eleições legislativas da Província em Buenos Aires. Mas o presidente confiou que moveria suas bases para responder e despertar o chamado “voto envergonhado”, não capturado nas pesquisas.
Por mais que os argentinos não estejam de todo contentes com o estado atual da economia, o medo de voltar ao passado falou mais alto. “DeRejeição
Trump parabeniza Milei, que agradece ao presidente americano
Javier Milei agradeceu ontem o apoio de Donald Trump após a vitória nas eleições legislativas. “Obrigado, presidente Donald Trump, por confiar no povo argentino. Você é um grande amigo da República Argentina”, disse, em uma publicação no X. “Nossas nações nunca deveriam ter deixado de ser aliadas. Nosso povo quer viver em liberdade. Conte comigo para lutar pela civilização ocidental, que conseguiu tirar mais de 90% da populagentina, além de eleições para o Congresso, ocorrem ao mesmo tempo votação para os Legislativos locais. As províncias, no entanto, têm prerrogativa de decidir se farão suas disputas no mesmo dia que as nacionais ou antes.
Cisão
Pela primeira vez, a Província de Buenos Aires decidiu fazer antes. Isso causou uma cisão interna no peronismo. Quem dividiu a oposição foi o governador de Buenos Aires, Axel Kicillof, indo contra Cristina Kirchner. Ela queria as eleições ao mesmo tempo, para não dissipar a popularidade dos líderes locais.
ção mundial da pobreza.” Alguns minutos antes, Trump havia parabenizado o argentino pela vitória “esmagadora”. “Ele está fazendo um trabalho maravilhoso. Nossa confiança nele foi justificada pelo povo argentino”, disse o americano, em publicação na rede social. Antes de deixar a Malásia, onde participou da cúpula da Associação das Nações do Sudeste Asiático (Asean), Trump disse que Milei contou com “muita ajuda” de Washington. O governo americano ofereceu um pacote que pode chegar a US$ 40 bilhões para fortalecer Milei antes da votação.
Força local
Em eleições locais, governadores, prefeitos e deputados de províncias têm muito mais força do que o presidente. Isso pesou nas eleições de 7 de setembro, porque o peronismo detém a máquina de mobilização. Já Milei, por ter um partido pequeno, não conta com essa força, apenas com o poder de atração de seu próprio nome.
Os argentinos que foram votar no domingo escolheram os candidatos da coalizão governista, A Liberdade Avança (LLA), sem olhar para seus nomes, mas sim para o de Milei.
Cristina Kirchner está presa e inelegível. Kicillof teve uma carreira de presidenciável que aparentemente durou So dias. Nofim, aúnicaliderançanacionalatual é Milei. Ao nacionalizar a votação, O presidente conseguiu uma vitória histórica na mesma província peronista que em setembro o castigou.
- Euforia: Milei comemora triunfo surpreendente nas urnas com colaboradores, entre eles Karina Milei. Efeito da ajuda de Trump abafou escândalos. Foto: Luis Robayo/AFP
 - Fonte: O Estado de S.Paulo